A bordo de um caiaque, Eugênio Manzini enfrentou o câncer e de quebra mais 12.500 km o esperam na costa brasileira
Enquanto passou dois anos em tratamento contra o câncer, o professor de educação física, Eugênio Manzini, 48 anos, tinha na cabeça apenas uma coisa: o projeto Remando pela vida – vencendo o câncer. Nele, Eugênio remaria pela costa brasileira a bordo de um caiaque para mostrar que além de vencer a doença também superaria um desafio e tanto no mar.
A&A:Quando descobriu que tinha câncer e quanto tempo teve que ficar em tratamento?
E.M: Eu descobri que tinha câncer em outubro de 2004. O tumor foi encontrado no pescoço, porém os médicos ainda não sabem como ele apareceu, por isso a cada seis meses preciso fazer exames para checar se está tudo bem. Com relação ao tratamento, a quimioterapia durou sete meses e também fiz 35 seções de radioterapia.
Aventura&Ação: Por que você escolheu o remo para fazer esse projeto?
Eugênio Manzini: Eu sou professor de educação física e sempre estive muito ligado ao mergulho e natação. Antes do câncer eu nunca tinha feito remo, mas o escolhi porque é a atividade aquática que exige mais esforço físico. E para me superar no esporte, como me superei na luta pela vida, precisava de uma atividade que realmente pedisse muito de mim.
A&A: Quando surgiu a idéia de remar como forma de superação ao câncer?
E.M: Todas as sextas-feiras eu ficava cerca de 5 horas nas seções de quimioterapia e para não desistir da vida me apeguei a essa idéia de remar pela costa brasileira quando tivesse superado a doença. Dessa forma eu também incentivava as pessoas que faziam quimioterapia comigo, elas viam que a doença não era ligada somente com a morte, mas com a superação, com a vida e no meu caso, com o mar.
A&A: Você remou o tempo todo sozinho, em algum momento achou que não iria conseguir?
E.M: Fazer esse trajeto sozinho foi mais complicado porque eu não contava com o apoio de ninguém enquanto estava no mar. Mas mesmo assim, eu nunca tive dúvidas de que conseguiria chegar aonde queria. Isso porque se eu venci o câncer, que não dependia do meu esforço, no remo, que eu só precisava da minha força para chegar, eu tiraria de letra (risos).
A&A: Quais foram as maiores dificuldades do trajeto?
E.M: Eu tive três pontos muito difíceis nessas duas travessias que fiz até agora. O primeiro foi um temporal que eu peguei saindo da Barra do Una e indo em direção a Bertioga. A chuva estava muito forte e eu errei a entrada de Bertioga, acabei tendo que remar por 12 horas até chegar à praia do Perequê, no Guarujá. O segundo momento foi na travessia do canal entre Cananéia e Iguape que aconteceu um fenômeno raro: a maré de Fizigia. Naquele dia a maré mudou apenas duas vezes e não quatro como de costume. Ou seja, tive de remar contra a correnteza durante quase 11 horas, ao invés das sete que eu tinha previsto. O terceiro foi quando eu perdi uma das mochilas de água no mar, entre Iguape e Peruíbe. A maior complicação é que com a radiação do tratamento contra o câncer eu perdi as glândulas salivares. Nesse trajeto tive que remar por cinco horas sem água doce, sendo que normalmente eu bebo em média um litro por hora.
A&A: E para a próxima travessia, no Rio Grande do Sul, você já sabe quais serão os momentos críticos que o esperam?
E.M: Já previ os principais que serão: corrente de água gelada que vem da antártica, um trecho de 130 quilômetros de mar aberto sem águas calmas ou abrigos e o trajeto que está na rota de navios dos portos perto de Santa Catarina.
A&A: Me fala um pouco sobre o barco, você o escolheu pelo nome?
E.M: Não tenha dúvidas, escolhi o caiaque que chama VENCEDOR para que fosse vitorioso comigo. A cor dele também é proposital. Vermelho é a cor do câncer e branco é pela paz. O barco é um Sky Rider extremamente instável, porém muito veloz. Ele tem apenas 52 centímetros de largura e quase 6 metros de altura.
A&A: Quantos quilômetros você remou no total?
E.M: Por enquanto eu remei 641 quilômetros, porém o projeto de remar a costa brasileira tem 12.500 quilômetros.
A&A: Como estão os preparativos para 2008?
E.M: Eu estou com alguns problemas de logística. Para remar o sul e sudeste foi mais fácil, pois podia levar o caiaque no meu carro. Mas para o restante do Brasil, ainda estou vendo como conseguirei transportar o barco. Fora isso todas as rotas já foram estudadas e pretendo terminar o projeto em maio de 2009.
A&A: Como é essa experiência para você?
E.M: Remar para mostrar que consegui vencer o câncer me deu ainda mais força. O mais legal é que por todos os lugares que eu passei, seja em praias nobres como no litoral norte de São Paulo ou perto de vilas de pescadores no litoral próximo do Paraná, muita gente se animava em me ver remando e vencendo a doença. Fiquei surpreso quando uma senhora que estava em um iate pediu para tirar uma foto minha para mostrar ao neto, que estava dentro do barco, triste porque estava com câncer. Ou seja, o trajeto que eu estou fazendo tem como objetivo mostrar para as pessoas portadoras da doença que elas também podem vencer o câncer como eu.
Rota escolhida
Até o mês de novembro, Eugênio Manzini concluiu duas etapas do projeto.
- Primeira fase 14 a 21 de abril: Paraty a Santos, em São Paulo – 331 km
- Segunda fase 24 a 28 de outubro: Paranaguá, no Paraná até Peruíbe, em São Paulo – 310 km
Em dezembro ele completará a terceira etapa, finalizando o trecho sul e sudeste do Brasil. A rota desenhada é do Farol de Santa Marta, no Rio Grande do Sul até Guaratuba, no Paraná, entre 22 a 5 de janeiro. Essa etapa terá o total de 655 quilômetros. Durante o ano de 2008 até maio de 2009, Eugênio pretende terminar os 12.500 quilômetros previstos.
Publicado na revista Aventura & Ação/ edição de janeiro de 2008
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